Importas-te muito que Deus exista?
Importas-te muito que uma névoa te desenhe o destino?
Que as tuas orações necessitem de um interlocutor?
Que o grande criador possa ser o grande injusto?
Que os torturadores possam ser filhos de Deus?
Que se tenha que amar a Deus sobre todas as coisas e não sobre os próximos e próximas?
Já pensaste que amar o Deus intangível produz um sofrimento tangível e que amar um corpo de rapariga que se pode tocar produz em troca um prazer quase infinito?
Por acaso acreditar em Deus apaga-te o prazer humano?
Terá Deus sentido prazer ao criar Eva?
Terá Adão sentido prazer quando inventou Deus?
Por acaso Deus ajuda-te quando o teu corpo sofre?
Ou não é sequer uma anestesia fiável?
Importas-te que Deus exista? Ou não?
A sua não existência será para ti uma catástrofe mais terrível que a morte pura e dura?
Importar-te-á descobrir que Deus existe mas que está imerso no centro de nada?
Importar-te-á que desde o centro de nada se ignore tudo e em consequência nada conte?
Importar-te – ia a presunção de que se bem tu existas Deus quem sabe?
MÁRIO BENEDETTI