Published quarta-feira, junho 29, 2005 by Rui Vieira.
Mais uma vez, António Albuquerque e Rui Vieira saem em Dose Dupla para animar a noite. Desta vez, o local escolhido é o bar JD em Espinho (junto à Câmara) e gostavamos de contar com a tua presença.
Published domingo, junho 26, 2005 by Rui Vieira.
Os livros virão ter a minha casa
Pelo nocturno vale
Pelos caminhos breves
Pelas sendas de azul
Pelas florestas ao longe
Os livros virão ter junto de mim.
Abro-os numa página
Uma página ao acaso
Lá dentro os teus olhos
Vão olhar-me de frente
Uma página adiante
Ou duas para trás
Hão de ter teus cabelos
Enrolando nos meus.
Uma página em branco
É a tua boca agreste
Como num sobressalto.
Os livros virão ter a minha casa
Mas em cada livro aberto
Em cada letra lida
És sempre tu que estás
Tal como em cada casa
Em cada rua à chuva
Cada montra olhada
Cada dia a dia
É teu corpo que sonho
Teu olhar magoado
Tua voz que cantava
A linha dos teus joelhos
Sobrepondo-se ao mar.
E nesses livros todos
Que me enchem as estantes
Nas suas gravuras secas
Suas letras esguias
Nas palavras que formam
O idioma é só um
A frase diz o mesmo
Só tu saberias
Traduzi-las para mim.
Os livros virão ter a minha casa
De uma qualquer maneira
Talvez pelo correio
Ou por alguém que os traga
Mas eu não saberei lê-los
Nem os seus dizeres se voltam
Para os meus olhos cegos
Desde que tu partiste.
Mas os livros ficarão
Para sempre guardados
Nesse lugar a que chamo
A minha casa.
in "Hotel Spleen"Bernardo Pinto de Almeida
Published domingo, junho 19, 2005 by Rui Vieira.
Não sei porque diabo escolheste
Janeiro para morrer: a terra está tão fria.
É muito tarde para as lentas
narrativas do coração,
o vento continua
a tarefa das folhas:
cobre o chão de esquecimento.
Eu sei: tu querias durar.
Pelo menos durar tanto como o tronco
da oliveira que teu avô
tinha no quintal.
Paciência, querido, também Mozart morreu.
Só a morte é imortal.
Eugénio de Andrade
in Poesia, p. 540, Fundação Eugénio de Andrade, 2000P.S. Nesta homenagem ao Poeta, junto a mágoa pelo companheiro da sueca que também esta semana perdi.
Published domingo, junho 12, 2005 by Rui Vieira.
Entrei no café com um rio na algibeira
e pu-lo no chão,
a vê-lo correr
da imaginação...
A seguir, tirei do bolso do colete
nuvens e estrelas
e estendi um tapete
de flores
a concebê-las.
Depois, encostado à mesa,
tirei da boca um pássaro a cantar
e enfeitei com ele a Natureza
das árvores em torno
a cheirarem ao luar
que eu imagino.
E agora aqui estou a ouvir
A melodia sem contorno
Deste acaso de existir
-onde só procuro a Beleza
para me iludir
dum destino.
José Gomes Ferreira
Published domingo, junho 05, 2005 by Rui Vieira.
Foi para a escola e aprendeu a ler
e as quatro operações, de cor e salteado.
Era um menino triste:
nunca brincou no largo.
Depois, foi para a loja e pôs a uso
aquilo que aprendeu
- vagaroso e sério,
sem um engano
sem um sorriso.
Depois, o pai morreu
como estava previsto.
E o Senhor António
(tão novinho e já era o "Senhor António"...)
ficou dono da loja e chefe de família...
Envelheceu, casou, teve meninos,
tudo como quem soma ou faz multiplicação!...
E quando o mais velhinho
já sabia contar, ler, escrever,
o Senhor António deu balanço à vida:
tinha setenta anos, um nome respeitado...
- que mais podia querer?
Por isso,
num meio-dia de Verão
sentiu-se mal.
Decentemente abriu os braços
e disse: - Vou morrer.
E morreu!, morreu de congestão!...
Manuel da Fonseca